sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Quem sou eu para julgar?

 

Parábola do fariseu e do publicano é uma penetrante crítica que desmascara atitude religiosa enganadora.


Por que nos sentimos mais próximos de Deus que os não praticantes? Quem sou eu para julgá-los?
Por José Antonio Pagola*
A parábola do fariseu e do publicano habitualmente desperta, em não poucos cristãos, uma repulsa grande para com o fariseu que se apresenta ante Deus arrogante e seguro de si mesmo, e uma simpatia espontânea para com o publicano que reconhece humildemente o seu pecado. Paradoxalmente, o relato pode despertar em nós este sentimento: "Dou-Te graças, meu Deus, porque não sou como este fariseu".

Para escutar corretamente a mensagem da parábola, temos de ter em conta que Jesus não a conta para criticar os setores fariseus, mas para sacudir a consciência de "alguns que, tendo-se por justos, se sentiam seguros de si mesmos e desprezavam os outros". Entre estes encontramos, certamente, não poucos católicos dos nossos dias.

A oração do fariseu revela-nos a sua atitude interior: "Oh, Deus! Dou-Te graças porque não sou como os outros". Que tipo de oração é esta de acreditar-se melhor que os outros? Até um fariseu, fiel cumpridor da Lei, pode viver numa atitude pervertida. Este homem sente-se justo ante Deus e, precisamente por isso, se converte em juiz que despreza e condena os que não são como ele.

O publicano, pelo contrário, só diz: "Oh, Deus! Tem compaixão deste pecador". Esse homem reconhece humildemente o seu pecado. Não se pode vangloriar da sua vida. Encomenda-se à compaixão de Deus. Não se compara com ninguém. Não julga os outros. Vive na verdade ante si mesmo e ante Deus.

A parábola é uma penetrante crítica que desmascara uma atitude religiosa enganadora, que nos permite viver ante Deus seguros da nossa inocência, enquanto condenamos, a partir a nossa suposta superioridade moral, todos os que não pensam ou atuam como nós.

Circunstâncias históricas e correntes triunfalistas alheias ao evangelho fizeram-nos a nós, católicos, especialmente propensos a essa tentação. Por isso, temos de ler a parábola, cada um numa atitude autocrítica: Por que nos acreditamos melhores que os agnósticos? Por que nos sentimos mais próximos de Deus que os não praticantes? Que há no fundo de certas orações para a conversão dos pecadores? O que é reparar nos pecados dos outros sem viver convertendo-nos a Deus?

Recentemente, ante a pergunta de um jornalista, o papa Francisco fez esta afirmação: "Quem sou eu para julgar um gay?". As suas palavras surpreenderam quase todos. Ao que parece, ninguém esperava uma resposta tão simples e evangélica de um papa católico. No entanto, essa é a atitude de quem vive em verdade ante Deus.
Instituto Humanitas Unisinos
*José Antonio Pagola é teólogo. A reflexão proposta é baseada no Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas 18,9-14, que corresponde ao 30º Domingo do Tempo Ordinário, ciclo C do Ano Litúrgico.

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