segunda-feira, 7 de março de 2016

As obras de misericórdia nos padres da Igreja



O convite que Jesus faz para segui-lo no cotidiano da existência é misericórdia do Pai.
Por Dom Vital Corbellini*

O convite que Jesus faz para segui-lo no cotidiano da existência é misericórdia do Pai. Ele acolhe os pecadores e as pecadoras para todos participar um dia da vida divina. Jesus é a imagem do Pai de modo que a misericórdia dele para com os sofredores e necessitados revela a misericórdia do Pai. Alguns padres da Igreja comentaram a vivência de obras para que a graça da misericórdia fosse de fato visível não só em palavras mas na concretude das pessoas e do Reino de Deus.

O amor em primeiro lugar
São João Crisóstomo, bispo de Constantinopla, século V, falava no primado do amor na vida diária (Comentário ao Evangelho de São Mateus, 46,4). Ele levanta uma pergunta: Qual é a coisa mais importante na vida? Cumprir milagres ou manter um ótimo e perfeito comportamento? Certamente ter uma conduta perfeita porque dessa maneira, trazem-se também os milagres que levarão ao seu devido fim. O fato é que quem dá provas de uma vida santa chama sobre si, o dom divino de cumprir ações milagrosas, e, quem recebe este dom o recebe para melhorar a vida dos outros. O Bispo João tem presentes a importância de realizar coisas boas porque elas enaltecem a pessoa e Deus. Cristo também cumpriu os milagres para ser fiel ao Pai, chamar a si atenção dos seres humanos, e introduzir à virtude nas suas vidas.
São João Crisóstomo convida as pessoas à prática do amor fraterno para viver bem os compromissos com o Senhor. Veja que nada pode alegrar mais os seres humanos que a vida. E falando de vida, não se entende só o jejum. Ainda que a pessoa se prostre sobre o saco e as cinzas, tendo o desprezo pelas riquezas, o fato é que se deve mostrar o amor para o próximo, no dar o pão ao pobre. Jesus pede de seus discípulos que aprendamos dele que é manso e humilde de coração (cf. Mt 11,29). Ele não quis que nós aprendêssemos dele a jejuar, ainda que faça-se lembrança dos quarentas dias de jejum feitos por Ele; exige antes que imitemos a sua mansidão e a sua humildade. Quando envia os seus apóstolos a pregar não diz a eles de jejuar, mas de comer tudo quanto dar-se-á para eles (cf. Lc 10,8). Quando os envia para anunciar o Reino de Deus solicita-lhes o desprendimento de tudo (cf. Mt 10,9; Lc 10,4). É claro que João não quer o desprezo do jejum, mas ele vem em segundo plano diante do amor de Deus.
As virtudes mais excelsas são a caridade, a humildade, a misericórdia, que precedam e superam as práticas de jejum. O pecado, a morte, o demônio são destruídos pela morte salvadora e redentora de Cristo Jesus e a sua ressurreição. Nós também podemos seguir o caminho do Senhor em realizar o bem para superar a morte e o pecado. A caridade é a raiz de todos os milagres, de todos os bens que nós podemos fazer neste mundo. Se nós praticarmos a caridade todas as virtudes que dessa derivam, não teremos a necessidade de milagres, ao contrário se não colocaremos em ato a caridade, não teremos nenhum proveito os milagres.

A misericórdia supera interesses
São João Crisóstomo colocava também a necessidade de atenção pelas pessoas que passam por dificuldades. A nossa atenção não é dada só para as pessoas conhecidas, mas também às desconhecidas. O amor deve ser universal, porque Cristo Jesus ama a todas as pessoas sobretudo as mais necessitadas. O bem seja feito para as pessoas não só para as conhecidas, mas as desconhecidas, para assim manifestar misericórdia de Deus. Nós somos chamados a usar de misericórdia para com todos e não simplesmente com os familiares, pessoas próximas, conhecidas ou famosas. Se alguém sofre há o direito de ser ajudado porque ele sofre, porque é preciso ajudá-lo como pessoa humana com amor. Nós não solicitaremos de quem seja quando alguém sofre: é de Deus, seja pagão, seja judeu. Também se a pessoa não acredita em Deus: ela precisa de ajuda.
São João Crisóstomo tomou o exemplo do samaritano que ajudou um judeu pelo fato da pessoa estar necessitada porque sofria na situação de ser assaltada e de estar esticada na terra, quase semimorta. Era preciso prestar alguma ajuda para aquela pessoa. O sacerdote e o levita passaram ao lado e não prestaram-lhes ajuda. O samaritano ajudou aquela pessoa, fazendo tudo com amor. Ele usou de misericórdia(cf. Lc 10,30ss.). O nosso Deus usa de misericórdia para conosco. Nós precisamos também usar de misericórdia para com as pessoas mais necessitadas que nós.

A misericórdia é um louvor de Deus para o ser humano
Leão Magno (Papa de 440-465) reforçou a graça da misericórdia para as pessoas. Ela opera em todas as pessoas, os cristãos, transferindo qualquer desejo humano dos bens terrenos àqueles celestes. A vida presente transcorre pelo dom do Criador e é sustentada pela sua providência. De fato, Aquele que doa gratuitamente os bens temporais é o mesmo que nos promete os bens eternos. Pela esperança da felicidade futura, na qual corremos pela fé, devemos agradecer a Deus por ele enaltecer-nos até acolher esta sua obra preparatória. De igual sorte os bens que adquirimos no curso de todos os anos honramos e louvamos Deus, que ao início deu fecundidade à terra, que impôs a toda semente a lei da fertilidade de modo que em todas as realidades criadas permanece continuamente operante o governo bondoso do Criador. Todas as coisas da natureza, o dia, a noite, o calor e o frio, as frutas e a caída das folhas e o florescimento das árvores, e outras coisas servem à nossa utilidade. A razão humana não chegaria a alcançar o efeito das suas obras, se Deus não lançasse ao nosso trabalho cotidiano, a semente e a irrigação, não acrescentasse o crescimento da mesma.

As graças do Senhor sejam multiplicadas
A plenitude da religiosidade e a justiça exigem que também nós ajudemos os outros com os dons que o Pai celeste nos tem dado com muita misericórdia. Muitas pessoas não tem nada, seja pelas terras, seja pelos seus frutos. Nós devemos providenciar às suas necessidades com abundância que Deus doou, assim que estes bendizem conosco Deus pela fecundidade da terra e foram dados os bens que esses colocam em comum com os pobres e os estrangeiros. Feliz é aquele que sacia a fome dos necessitados e dos débeis, que eleva as necessidades dos estranhos, que alivia a dor dos pobres e dos doentes. A divina justiça quis que todos os que sofrem e tem doenças de toda a espécie, fosse coroada pela sua paciência e os misericordiosos pela sua bondade.

Conclusão 
A misericórdia traduz-se pelo amor a Deus, ao próximo e a si mesmo. Na medida que nós amarmos as pessoas e a Deus somos misericordiosos como o Pai é misericordioso. O Pai quer-nos ver realizando obras de misericórdia. O Senhor nos ajude a viver a misericórdia com amor no dia a dia. A misericórdia é dom de Deus e, também é, missão humana.
CNBB

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