O fenômeno da corrupção vem de longe, no tempo e na geografia. É um mal
histórico e, praticamente, onipresente. A ele se reportam, por ângulos
próprios e comuns, a justiça, a administração, a imprensa, a religião, a
polícia, a academia, a literatura e a voz do povo. A religião não pode
deixar de denunciar a face iníqua da corrupção que sempre causa
prejuízos à coletividade. No Antigo Testamento, os profetas denunciam a
corrupção praticada por administradores públicos e por pessoas. Amós e
Miquéias são exemplos nessa linha de denúncia porque têm palavras muito
duras contra quem pratica a corrupção. “Eu digo: ‘Ouvi bem, chefes de
Jacó, dirigentes da casa de Israel: Por acaso não é vossa obrigação
saber o que é de direito? Mas sois pessoas inimigas do bem e apaixonadas
pelo mal. Arrancais o couro dos outros e até a carne que está por cima
dos ossos. Sois aqueles que devoram a carne do meu povo e lhe tiram o
couro como se fosse uma roupa. Partis seus ossos, quebrando-os como se
fosse para cozinhar, carne picada que vai para a panela. Depois, ainda
clamarão ao Senhor mas ele não há de lhes dar resposta. Ele, naquela
hora, se esconderá dessa gente por todo o mal que praticaram.’ (...)
Ouvi bem, chefes da casa de Jacó, dirigentes da casa de Israel, vós que
tendes ódio ao que é de justiça e perverteis tudo o que é reto, que
construís Sião com sangue derramado, Jerusalém com injustiças. Seus
chefes dão sentença a troco de uma propina, seus sacerdotes instruem em
vista do lucro, seus profetas adivinham por dinheiro. E é no Senhor que
se apóiam, dizendo: ‘O Senhor está no meio de nós, nada de mau nos
poderá acontecer!’.” (Mq 3,1-4.9-11)
Em toda e qualquer forma de corrupção, é visível o prejuízo social,
porque os benefícios não chegaram à população e, quando chegam, via de
regra, têm a marca da má qualidade; isso acontece, com muita frequência,
em caso de desvio de verbas e de superfaturamento em contratos entre o
poder público e a iniciativa privada. Miquéias denuncia as autoridades
pela prática do suborno, da propina. Tanto no seu tempo quanto hoje, o
dinheiro na mão de pessoas inescrupulosas é sempre um perigo próximo
para a prática da corrupção, qualquer que seja a sua condição -
governante, empresário, juiz, policial, sacerdote.
A população está acompanhando o julgamento do “Mensalão”, no Supremo
Tribunal Federal, uma prática coletiva de corrupção, tendo como mentores
e patrocinadores políticos e empresários muito conhecidos no cenário
nacional; contemporaneamente, acontece outro julgamento, por uma
Comissão Parlamentar Mista de Inquérito, no Congresso Nacional, também
envolvendo políticos e empresários. Salta aos olhos do juiz mais atento e
do cidadão mais comum que se está diante de um evidente caso de
corrupção. Sendo um julgamento, necessariamente, há a tese - a acusação
do Procurador Geral da República - a antítese – a defesa dos Advogados
dos réus – e a síntese - o julgamento dos Ministros do STF. A sociedade
espera que, diante da realidade dos fatos, o resultado seja a punição
dos culpados, na medida cabível, a fim de que não se confirme mais um
caso de impunidade.
Os corruptos do tempo de Miquéias já usavam “o nome de Deus em vão”,
dizendo “nada de mau nos poderá acontecer”; os corruptos daqui e de hoje
também sabem que “nada de mau nos poderá acontecer”, porque a
impunidade tem sido a marca registrada, em casos semelhantes. Será que
vai acontecer isso, mais uma vez? Um julgamento justo, neste caso, é uma
questão de dignidade para os Ministros do Supremo Tribunal Federal.

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