sábado, 18 de maio de 2013

O Espírito Santo: a memória do futuro

Artigo de Raymond Gravel, publicado no site Réflexions de Raymond Gravel, em 19 de maio.

A celebração do Pentecostes encerra o tempo pascal. É, portanto, tendo sempre presente a Páscoa que devemos celebrar esta festa do Espírito Santo. Não devemos fazer do Pentecostes um acontecimento material e histórico; é no centro da Páscoa de Cristo, morte e ressurreição, que o Espírito foi dado aos discípulos e que é dado a nós ainda hoje. O Espírito que ressuscitou Jesus e que o fez Cristo e Senhor, é o mesmo Espírito, nos diz São Paulo, que nos faz filhos e filhas de Deus: “O próprio Espírito assegura ao nosso espírito que somos filhos de Deus” (Rm 8, 16). Se a Páscoa é a fonte e o cume da vida cristã, com o Pentecostes completa-se a nossa vida cristã. Mas o que muda para nós o fato de sermos habitados pelo Espírito Santo, o Espírito de Cristo?

O Espírito é Amor

No Evangelho de São João, Deus é Amor e para conhecê-lo precisamos fazer a experiência do Amor. E qual é? “Se alguém me ama, guarda a minha palavra, e meu Pai o amará. Eu e meu Pai viremos e faremos nele a nossa morada” (Jo 14, 23). Se eu li corretamente este versículo do evangelista João, é o Amor que nos une a Cristo e a Deus. Mas como sabê-lo? “Se vocês me amam, obedecerão aos meus mandamentos. Então eu pedirei ao Pai, e ele dará a vocês outro Defensor, para que permaneça com vocês para sempre” (Jo 14, 15-16). E São João precisa (infelizmente, essa parte foi excluída do evangelho de hoje): “Ele é o Espírito da Verdade, que o mundo não pode acolher, porque não o vê nem o conhece. Vocês o conhecem, porque ele mora com vocês e estará com vocês” (Jo 14, 17).

Portanto, se formos capazes de amar, segundo o Evangelho de João, é porque somos habitados pelo Espírito de Cristo que é Amor. A questão que surge é a seguinte: será o Amor seletivo? Devemos amar somente aqueles e aquelas que pensam como nós ou que fazem parte da mesma Igreja que nós? A resposta é, evidentemente, não! Porque o Espírito é universal.

O Espírito é universal

Isso quer dizer exatamente o quê? Em sua primeira carta aos Coríntios, São Paulo escreve: “Existem dons diferentes, mas o Espírito é o mesmo; diferentes serviços, mas o Senhor é o mesmo; diferentes modos de agir, mas é o mesmo Deus que realiza tudo em todos. Cada um recebe o dom de manifestar o Espírito para o bem de todos” (1 Cor 12, 4-7). Será que o Espírito habita mais os católicos que os outros cristãos ou mesmo que os outros crentes? Não creio, porque na história, numerosos são aquelas e aqueles que, por Amor, souberam trabalhar “em vista do bem de todos” (1 Cor 12, 7), tornando o mundo melhor e mais humano. Há mesmo, entre eles, aqueles que se dizem não crentes: são eles habitados pelo Espírito sem mesmo sabê-lo? Talvez! A questão, entretanto, permanece aberta.

Uma coisa é certa: no livro dos Atos dos Apóstolos, na primeira leitura de hoje, quando Lucas relata o acontecimento teológico do Pentecostes, são todas aquelas e todos aqueles que estavam reunidos que ficaram repletos do Espírito Santo (At 2, 4). São Lucas não diz que somente os virtuosos são habitados pelo Espírito. Não! Podemos supor que eram muitos os que estavam ali reunidos junto com os Doze e os discípulos, transformados pelo Amor e reunidos num mesmo lugar teológico, isto é, o coração humano, onde o Espírito estabelece sua morada.

O Espírito é movimento

No evangelho de São João, Jesus fala da fidelidade à sua palavra (Jo 14, 23). Normalmente, diz o exegeta francês Jean Debruynne, “a imagem que, com mais naturalidade, vem da fidelidade é da solidez, isto é, da rocha, do enraizamento, do que resiste e que não se move. Jesus, ao contrário, inscreve a palavra fidelidade no movimento. Para Jesus, a fidelidade não é uma estátua ou um monumento; o Espírito é movimento”. No fundo, a fidelidade exige o Amor e o Amor não pode ser estático. Amar é não se apegar ao passado; é olhar sempre para frente, para o futuro: é evoluir, questionar-se, converter-se, deixar-se transformar pela vida. O Amor não é nunca intransigente, intolerante; o Amor espera e permite que todos os possíveis se realizem. E é o Espírito que habita o coração daquela e daquele que ama, que age e que se coloca em movimento.

Lembremo-nos de que, na semana passada, no Evangelho de Lucas, após a Ascensão, os discípulos retornaram ao Templo de Jerusalém: “E estavam sempre no Templo, bendizendo a Deus” (Lc 24, 53). Isso quer dizer que eles ainda não estavam em movimento; eles não tinham tomado consciência de que eram habitados pelo Espírito Santo e que deviam sair do Templo para partir em missão. Nesse dia do Pentecostes eles se deram conta de que deviam sair do Templo para transmitir o sopro de vida (vento), para reunir no Amor todos os povos (fogo) e para comunicar a todos e todas o Amor universal (línguas). Este é o papel do Espírito Santo.

O Espírito é Memória

"Mas o Defensor, o Espírito Santo, que o Pai vai enviar em meu nome, ele ensinará a vocês todas as coisas e fará vocês lembrarem tudo o que eu lhes disse” (Jo 14, 26). Mas atenção! O que Jesus disse não é um fim em si: é um começo, é uma semente. E o Espírito Santo, o Espírito de Deus que é a energia que cria e recria, faz acontecer a Palavra, a partir desta semente que era Jesus Cristo, Palavra e Verbo de Deus. O Espírito Santo vem hoje avivar a nossa memória; ele nos faz lembrar o Futuro.

O teólogo francês Gérard Bessière escreve: “Esta memória é uma semeadura. Nela se esconde a semente lançada pela mão do semeador, a minúscula mostarda que promete crescimentos noturnos e o grão que parece morto no sulco ensanguentado. Palavras e atos de Jesus fermentam no terreno da nossa história, mesmo nos lugares humanos mais afastados das nossas igrejas”.

Concluindo, simplesmente gostaria de acompanhar a reflexão de Gérard Bessière, que escreve: “Um teólogo escreveu que, ao celebrar a Eucaristia, os cristãos se recordam do que será. Estranha memória voltada para o futuro. Mas verdadeira memória de Jesus, porque havia milhares de antecipações em relação ao seu tempo e nós apenas começamos a caminhar na direção do horizonte que ele nos mostrou. Gostaria que todo homem, e toda a humanidade, se tornasse novamente criança, e mesmo nascesse de novo. Suas atitudes, suas iniciativas, suas partilhas eram contagiantes desta vida inesperada onde as crispações, as durezas, os remordimentos se apagam na liberdade fraterna das crianças do Deus caloroso que dá e perdoa. Sonho, utopia? Sim, mas sonho e utopia que fecundam a história e que reavivam incessantemente os homens. O Espírito nos faz lembrar o que será. Nas trevas em que muitas vezes andamos tateando, é fogo que abrasa, ilumina e aquece”.

O Espírito Santo é a memória do futuro...
Réflexions de Raymond Gravel

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