sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O Papa Roncalli e a Igreja vista de Taizé


Muitas vezes ouvi o Ir. Roger repetir estas palavras: "O fundador de Taizé é João XXIII". E, em certo sentido, é verdade. A análise é do Ir. Alois de Taizé, prior da Comunidade de Taizé, na França.

Aquilo que vivemos em Taizé hoje, como comunidade ecumênica, seria impensável sem a realidade do Concílio. Se, como jovem católico de 16 anos, eu pude ir a Taizé em 1970 e aprofundar a minha fé com cristãos de diversas confissões, é graças ao Concílio Vaticano II.
Muitas vezes ouvi o Ir. Roger repetir estas palavras: "O fundador de Taizé é João XXIII". E, em certo sentido, é verdade. Giuseppe Roncalli, o irmão mais novo do papa, também expressou esse pensamento um dia.
Passados alguns anos desde a morte de João XXIII, Giuseppe Roncalli foi a Taizé junto com seus familiares por duas vezes. Ele observou o conjunto da nossa vida e da nossa acolhida, e notou como os jovens era acolhidos simplesmente. E uma noite ele disse ao seu neto Fulgenzio, que o acompanhava: "O que quer que aconteça com Taizé, foi o meu irmão, o papa, que começou".
Para entender tal influência de João XXIII e do Vaticano II sobre Taizé, parece-me importante traçar a presença do Ir. Roger em Roma durante os quatro anos conciliares. A pedido do cardeal Gerlier, então arcebispo de Lyon, o Papa João XXIII recebeu o Ir. Roger e o Ir. Max logo alguns dias depois da sua eleição. Desde já, entre o papa e o prior de Taizé, criou-se um vínculo que quase poderíamos definir como de parentela, um laço de corações. O Ir. Roger voltaria todos os anos para encontrar o papa. O cardeal Marty, arcebispo de Paris, afirmou um dia: "Foi graças ao fato de João XXIII conhecer pessoalmente os irmãos de Taizé que ele teve a coragem de convidar observadores não católicos ao Concílio".
A partir do momento que que recebeu a carta de convite para ele e para o Ir. Max ao Concílio, o Ir. Roger ficou convencido de que não devia simplesmente participar da assembleia, mas também de que devia levar a Roma a vida de Taizé. Acima de tudo, ele desejava que Taizé garantisse ao Concílio uma presença de oração, particularmente de oração pela unidade dos cristãos.
Portanto, foi preciso encontrar uma casa na cidade, em que os diversos irmãos pudessem habitar, para rezar juntos como em Taizé, e acolher. Assim, foi alugado um apartamento de quatro quartos na Via del Plebiscito, em pleno centro de Roma, não muito longe do Vaticano.
A acolhida foi essencial nesse alojamento romano dos irmãos, especialmente por ocasião das refeições, ao meio-dia e à noite.
As memórias dessa acolhida podem ser encontradas em muitos diários do Concílio publicados nos últimos anos, dos cardeais Congar, De Lubac, do bispo brasileiro Hélder Câmara.
Por exemplo, depois de ter sido convidado pelos irmãos, o Pe. Congar escreveu: "Eles souberam recriar o seu próprio clima no apartamento em que vivem. Recebem muitos hóspede. Praticamente não há refeição à qual não sejam convidados às vezes cinco ou seis bispos. E assim, neste momento, tem-se um Concílio feito de conciliábulos e de amizades, o que contribui para criar o clima do Concílio propriamente dito".
Sempre, antes de se sentar à mesa, os hóspedes participavam da oração comum dos irmãos. Os pratos são frugais. Alguns bispos confidenciam entre si: "Antes de ir almoçar nos irmãos de Taizé, é melhor comer alguma coisa em casa...". No apartamento, muitas vezes há arroz, molho de tomate e um pouco de vinho, e sempre flores sobre a mesa.
Os hóspedes muitas vezes vinham de muito longe. O Ir. Roger quis aproveitar a oportunidade oferecida pela assembleia conciliar e dar preferência para quem vem de outros continentes, especialmente aos latino-americanos, com os quais se estreitariam amizades duradouras. Sucediam-se também observadores ortodoxos e protestantes, peritos, auditores e auditoras leigos, jornalistas... Ao redor da mesa, aprofundava-se a experiência única de todos os Padres conciliares na Basílica de São Pedro: uma experiência de comunhão eclesial e humana determinante.
O Ir. Roger escreveu aos irmãos de como as trocas nos ensinam a aceitar a diversidade, e debates levam a entender quem é distante, em termos de origem e de posição. E não poupa o esforço de tecer laços com as minorias opostas às orientações do Concílio. Ele escrevia aos irmãos: "Toda vez que alguém intervém para pedir uma maior atenção à Bíblia, a uma piedade da qual Cristo vivo seja o centro, a minha alma treme de alegria. [...] A atenção se torna mais intensa quando, sob as abóbadas de São Pedro, ouvimos um bispo afirmar o que corresponde às nossas aspirações essenciais: a presença do cristão no mundo contemporâneo, a comunicação do Evangelho, a busca da paz".
Pouco antes de sua morte, por ocasião da última audiência concedida ao Ir. Roger e a dois irmãos, João XXIII reiterou a sua visão do lugar de Taizé na Igreja. Com grandes gestos circulares das mãos, disse: "A Igreja Católica é constituída por círculos concêntricos cada vez maiores, cada vez maiores". Em qual círculo ele via a nossa comunidade, ele não especificou. Mas o Ir. Roger entendeu como, para o papa, estávamos dentro dos círculos, e como o essencial já havia sido feito.
Falava-se à época da "Igreja dos pobres": o Ir. Roger não gostava muito dessa expressão. Para ele, a Igreja era de todos. O título de uma pequena obra do Pe. Congar, ao contrário, lhe agradava mais: "Por uma Igreja serva e pobre".
Durante o Concílio, o Ir. Roger se ligou profundamente a inúmeros bispos latino-americanos. Foi também graças a esses contatos que foi possível lançar as bases das nossas pequenas fraternidades que vivem entre os mais pobres dos continentes do Sul.
Ir. Alois de Taizé, prior da Comunidade de Taizé, na França. O artigo foi publicado no jornal dos bispos italianos, Avvenire, 19-12-2012.

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